Chega uma hora em que você se cansa de contar carneiros. O silêncio penetra por seu corpo mas o sono não vem. A luz está apagada, mas você percebe que não enxerga menos por causa disso, na verdade, enxerga mais do que deveria. As horas passam, coisas se mexem, se transformam e o mundo gira. Sei que é difícil crer no que os olhos não podem ver, mas nada é como parece ser.

sábado, 6 de outubro de 2012

A Última Noite em Meu Quarto Azul

A porta estava fechada. Empurrei-a e me deparei com uma visão bem diferente da habitual: Minha estante de livros estava agora vazia, nela apenas o computador. As gavetas estavam abertas e não revelavam nenhum conteúdo em seu interior. A cama, forrada e limpa, apenas me esperava para o que seria minha última noite naquele quarto de paredes azuis. O meu quarto. Meu primeiro quarto. Não eram muitos os anos que me prendiam àquele cômodo da casa, tampouco as lembranças, pois nada memorável acontecera ali. Não eram também os sonhos em que eu acordara de repente e me deparara com a escuridão da noite fria, quando o vento entrava pela janela fazendo balançar a cortina. Era meu aniversário, em dezembro e como de costume pendurei minhas luzes de natal no andar de baixo da casa. A chuva caía forte, castigando os telhados vizinhos e lançava lufadas de vento pela janela. As luzes piscavam lá fora, coloridas, em um brilho embaçado no vidro enquanto eu me punha a pensar. Me mudaria no dia seguinte para bem longe, distante do meu quarto, família, amigos e de todas as coisas vividas naquela pequena cidade do interior, onde minha história começou. Quantas vezes aquelas paredes me viram sorrir com os livros que foram meus melhores amigos por tanto tempo? Quantas vezes elas foram testemunha de minhas tristezas e choros constantes onde não havia ninguém para desabafar? Será que haviam notado as conversas que eu costumava ter comigo mesmo e me acharam maluco? Ou haviam me compreendido sempre? Afinal de contas, paredes isolam. Podem servir de prisão e, ao mesmo tempo, refúgio. Podem ser a segurança de alguém que foge dos pensamentos ou apenas procura um lugar seguro para conversar com eles, em particular. Acho que elas me serviram de tudo um pouco, pois as vezes eu só queria ficar ali, olhando para cada uma delas, sempre impassíveis em seus julgamentos, o que me obrigava a voltar para mim mesmo, a pensar na vida que se passava lá fora e nas coisas que faziam parte de mim. Me convidavam a criar histórias interminadas em folhas de papel que alimentavam meus sonhos de criança e a criar esperanças infundadas a respeito de tudo e de todos. Foi dentro delas que cresci e refleti sobre meu próprio mundo e as maravilhas que haviam nele, muitas das quais ajudei a construir. Penso que, se as paredes pudessem falar, haveriam conversas intermináveis sobre um menino que vivera ali, cercado durante muito tempo por elas. Curioso. Sonhador. Confiante. Corajoso. Que precisou chorar e sofrer para ficar forte, aprender a enfrentar a vida cara a cara. Um menino indecifrável sobre o qual era impossível afirmar se estaria feliz ou triste no momento seguinte. Poderiam rir de minhas danças desconexas antes de ir para a escola e de minhas cambalhotas na cama ou se compadeceriam ao recordar meus constantes dilemas em voz alta. Quem sabe até fariam orações em resposta a tantas que fiz olhando para elas? O sono chegara e eu fechava meus olhos cada vez mais. Abri- os novamente para dar uma última olhada ao redor e agradecer por guardarem meus segredos para sempre. "Amanhã"- pensei em voz alta- "o único azul que verei será o do céu acima de mim".

domingo, 18 de dezembro de 2011

Você...



Fico feliz quando ouço a sua voz
Mas me sinto incompleto por você estar distante
É como se o dia insistisse em não terminar sem um sorriso teu
Sem nossas conversas jogadas fora meus sonhos não me deixam dormir em paz

Quero colocar você em um lugar seguro
Onde nada nem ninguém me tirem você e aquilo que você tem de melhor
Quero te guardar para sempre em versos e sentimentos
Onde o tempo, a distância e outras pessoas jamais apagarão

Queria correr e te abraçar pelo menos por um segundo
Sentir que você faz parte do meu mundo
E mesmo que eu não escute sua voz em uma canção
O lugar em que vou te guardar é no meu coração

E, se as vezes uma coisa ou outra nos magoar e nos fizer ficar distantes
Meus pensamentos sempre me guiarão de volta
Essa é a prova mais viva e palpitante
De que me importo e preciso de você.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Chorar é preciso


Eu preciso do choro.

Sei que ele está aqui, guardado em algum lugar. Latente. Como um vulcão que passa décadas adormecido e de repente resolve acordar.

Preciso aprender a entrar em erupção. Sentir o corpo se aquecendo enquanto ele se desperta do fundo da alma e sobe em direção aos olhos. Sentir a energia, o vibrar, o alívio de “colocar para fora”.

Espero ansioso pelo dia em que o choro chegue e carregue, como em uma enchente, os desprazeres da vida de até então. Que despeje no olho da rua tudo aquilo que não é bem vindo.

Tudo isso só para poder respirar ofegante, livre e me sentir vivo. Pois as lágrimas nem sempre significam tristeza. As vezes elas são a única chance que temos de abrir as portas emperradas para tentar ser feliz outra vez.

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Viver


Possuo apenas uma ânsia, esta bem simples e pequena: Viver. Fazer de coisas simples aventuras intensas. Poder olhar para trás e sentir que deixei minha marca e não apenas passei e fui embora. Não quero viver de resquícios putrefeitos de arrependimento e muito menos me sentir culpado por aquilo que não tenho nada a ver, pelo contrário, quero sempre encontrar motivos, por menores que sejam, que me convençam de que tudo valeu a pena. Quero derrubar as paredes que limitam minhas idéias. Me livrar das amarras que me impedem de voar. Quero extinguir meu medo de tentar. Quero pensar que, quem de mim não gosta, é simplesmente porque não sabe enxergar o que tenho de melhor e que não há nada de errado comigo, afinal. E quer saber? Não me importo mais. Saiba me ganhar e você terá um grande amigo, talvez o melhor. Me despreze e fique tranquilo, não sou tão mesquinho a ponto de fazer o mesmo com você, mas tenho fé suficiente para acreditar que a vida cuidará do resto. Não espere que eu te ignore se você precisar de mim. Não cumpro promessas de esquecer pessoas assim, tão facilmente. Por amar exageradamente talvez seja bobo, mas a solidão, minha melhor amiga, me ensinou a enxergar além, além de um rostinho bonito ou de um aparente sorriso bondoso. Ela não quer me deixar, tão amigos que somos, e não quer me entregar tão fácil nas mãos de qualquer um também. Como podem ver, a solidão é amiga apenas de quem merece.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Perder-se também é caminho


Sobrevivo de realidades inventadas. No sono vivo de sonhos, mundo em que estou e não estou. O ser que adormece agora não é nem a sombra do que acordou pela manhã. Passaram-se pessoas, fatos, gestos, toques, palavras... servindo hora como faca afiada, hora como a mais eficiente essência de crescimento. Vagueio por entre esses momentos, cada qual diferente do anterior. Nada é constante. Livrei-me da escória do passado onde fazer tudo certo era prioridade. Descobri que deixei de viver e que na verdade nunca vivi, pois tudo passa, como as nuvens a favor da brisa ou de ventos mais fortes.

Talvez o caminho não tivesse sido esse, caso não houvesse também, me perdido. Talvez a realidade fosse pior (ou melhor quem sabe?) que essa constante metamorfose de agora, que seria metamorfose de qualquer jeito? Quem sou eu para definir o certo e o errado? O melhor e o pior? Apenas vivo. Ou sobrevivo, dos entalhes de outros sobreviventes que já estão lá adiante, onde minha vista não pode alcançar. Colho as frases em que me encaixo, os pensamentos com os quais concordo e me surpreendo por termos tanto em comum. Quem disse que verdades são sempre palavras bonitas? Não! Belas ou monstruosas, verdades são sempre verdades.

Se tudo é passageiro, porque velhos pensamentos insistem em voltar à tona? Porque o sofrimento insiste em deixar sua marca quando passa? Já passou, não? Eu não sou o mesmo, então qual a razão de permanecer carregando comigo feridas de um ser que não sou? Ou que fui em um passado distante? Quero o novo, o belo, o inesperado. As surpresas, os gritos de "Oh", os risos, os aplausos, a gratidão sincera, uma marca construtiva. Nada que tenha sido previsto me agrada.

Mentir pode ser um caminho que nos salve, por hora. Não quero enganar ninguém dizendo que existem bússolas, ou espelhos, ou algo que nos sirva de guia para chegar onde queremos. Escolher pode ser uma ilusão, pois, ou os caminhos do mundo são predeterminados ou tudo é mesmo muito dinâmico, e caso a escolha esteja errada a culpa é toda sua. E, no fim de tudo, nossa vida, nossas palavras, nossas atitudes e tudo o que é ligado a nós está desencontrado, separado,
perdido. E talvez a única forma de nos encontrarmos seja nos perdendo primeiro, pois, afinal de contas, perder-se também é caminho.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Inverno sem Neve


Costumo sentir falta de coisas que não conheço, de coisas que nunca tive. Uma sensação de vazio que as coisas próximas não preenchem nunca. Algumas delas até que conseguem chegar bem próximo dos meus anseios, mas nunca substituem o desejo original. É uma coisa estranha, como se algo levasse a querer sempre estar além daquilo que nos cerca.

Sinto falta daquela presença branca, daquele brilho dos fins de tarde e daquilo que emperra as portas, pela manhã. Falta daquele movimento gelado e do ar condensado que sai dos pulmões em forma de fumaça quando ela está presente. Apesar de ser uma realidade distante, ela me aguça a pensar em dias felizes, dias em que meus amigos correm com seus casacos e sobretudo pelas ruas cinzentas, ásperas e molhadas, fazendo bolas de neve fofas e jogando uns nos outros enquanto na esquina, dois deles se empenham em criar um boneco de neve, quase pronto.

Quando a noite se aproxima e começa a escurecer, o vento castiga as janelas fechadas fazendo-as zumbir quando ele passa. Segundos depois ela cai, de início em pequenos flocos e um deles pousa na ponta do meu nariz, despertando desejos, sonhos, conquistas e muitas coisas que um dia serão apenas meras lembranças. A neve cai leve, despreocupada, muda de direção quando quer até atingir o chão, onde permanece.

Como se fizesse festa, ficando maior e caindo depressa, a neve nos faz um novo convite. Pede para que entremos em nossas casas aconchegantes, com pisos de madeira recém encerada, adentremos por nossas salas, onde a lenha crepitante alimenta o fogo na lareira e há uma poltrona só nossa nos esperando. Quase perfeito. Falta o chocolate quente que em um minuto fica pronto. A xícara fumegante espalha lufadas de vapor em nosso rosto e nos sentamos, olhando para a grande janela ao lado. Lá fora, branca e silenciosa, ela continua a cair, pedindo apenas que nunca nos esqueçamos dela, da neve tão antiga que mantém muitos segredos escondidos sob seu aspecto macio. Da neve que acompanha os humanos em tempos difíceis e que permanece viva para sempre, em suas memórias.

Para mim, só o que resta é imaginar como é tudo isso. A noção que tenho é baseada em fotos e descrições que li em livros. Em um clima tropical de altitude acho que é esperar demais que algo assim aconteça, mas, ela não está menos presente, menos real por causa disso. O inverno chegou, trazendo suas ondas frias e seus ares escuros, mas a neve, esta eu ainda não vi chegar.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Fragmentos do Tempo


A vida de cada pessoa gira em torno de sua essência. Algo que passa por transformações, mudanças e lapidações, mas que, no fundo permanece inalterado. Há o fragmento de tempo em que sorrimos, dizemos "bom dia" até para o vento, sentimos vontade de correr e abraçar o mundo com nossos minúsculos braços, abarcar todas as realidades possíveis e viver todas as formas de vida que existem. Essa é nossa natureza dinâmica, livre, solta, leve e envolvente. É a alma que quer se desprender do corpo, a sombra que quer andar com seus próprios pés, e o cérebro que quer se desatar do coração. É a busca inerente do ser humano pela descoberta, pelo conhecimento, pelo desconhecido e misterioso.
Há também os fragmentos do tempo em que queremos estar sós. Isolados de tudo e de todos. A tristeza bate nas portas do coração e ele, em sua bondade, a acolhe. O mundo escurece e nada parece bonito como fora um dia. As coisas simples perdem a cor e o brilho. O sol não esquenta o suficiente e trememos de frio. Algumas coisas nos acuam, nos prendem, amarram e dizem "Você só sai daí quando eu mandar!" Pronto, é o tempo outra vez.
Mas há algo além que nos renova sempre. Uma capacidade mágica de recriar a vida e o ser. Nos fazer levantar das cinzas e brilhar de novo. Sacudir a poeira e sorrir. Enxugar as lágrimas e começar da estaca zero. Os buracos se fecham e ficam as marcas, mas, com o tempo, as cores voltam, as flores se abrem e o sol aquece novamente. Nada está perdido, pois o tempo, apesar de parecer longo quando sofremos e curto quando estamos felizes, é apenas o suficiente para construir cada ser humano tal qual ele deve ser, em forma e essência.